A pandemia retirou muitos funcionários dos seus locais de trabalho habituais e das suas rotinas usuais de deslocações. Apesar de ter parecido um incidente feliz para muitos, tornou-se evidente que o percurso casa-trabalho-casa também se pode tornar um problema. Como mudar esta realidade?
A simples deslocação para o local de trabalho acaba por ser, para muitos, uma causa de ansiedade, dificultando a gestão da sua vida pessoal e profissional. Estima-se que, atualmente, cerca de quatro milhões de portugueses usem carro próprio para se deslocar até ao local de trabalho, gastando no geral, mais de um salário mínimo por ano nesta deslocação.
Com o recente aumento do preço dos combustíveis, é provável que estes números, provenientes de um estudo realizado pela Marktest em 2020, venham a aumentar, tornando ainda mais urgente a criação de soluções alternativas mais atrativas para a deslocação casa-trabalho-casa.
Um estudo realizado em 2021 pelo ManPower Group Portugal parece conclusivo: 79% dos trabalhadores afirma que o teletrabalho aumenta a sua produtividade e que se mantém o seu regime de preferência, não só porque perdem menos tempo com a deslocação casa-trabalho-casa, mas também porque passam a ter mais tempo para a família e mais qualidade de vida.
No entanto, um estudo realizado no Reino Unido e publicado em setembro de 2021 chegou à conclusão de que cerca de metade dos trabalhadores espera algum tipo de benefício com o regresso ao escritório. O estudo, realizado pela University College London (UCL), mostrou que cerca de 48% das pessoas que voltariam ao local de trabalho esperavam melhorias na sua saúde mental, enquanto 46% esperavam melhorias no equilíbrio entre a vida pessoal e a vida profissional.
“A viagem até ao local de trabalho traça fronteiras entre a vida pessoal e a vida profissional e pode ser usada para desativar uma e fazer a transição para a outra. O simples facto de irem para o trabalho gera experiências mais diversas do que trabalhar a partir de casa, especialmente pela interação com outras pessoas”
Explicou o Professor Joseph Devlin, um dos académicos da UCL envolvidos no estudo.
Segundo estatísticas da Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound) e do Centro de Investigação Comum da Comissão Europeia, publicados em outubro de 2021, mais de um em cada três trabalhadores poderia realizar o seu trabalho fora do local de trabalho, ou seja, cerca de 35% dos trabalhadores.
Durante o primeiro confinamento, cerca de 22% dos trabalhadores portugueses ficaram a trabalhar a partir de casa e no início de 2021, a percentagem desceu para 21%. No entanto, o mercado português esteve entre os que se atiraram de forma mais expressiva para o teletrabalho: de 4,8% em 2019 para 13,4% em 2021. No entanto, é pouco provável que este número se repita.
Segundo dados de 2019 do Instituto Nacional de Estatística (INE) baseados no Inquérito ao Emprego sobre a “Organização do Trabalho e do Tempo de Trabalho”, indicam que mais de 68% dos portugueses demora, em média, 30 minutos nas deslocações para o trabalho, perdendo mais de 200 horas num ano, se contabilizarmos apenas os dias úteis.
Segundo o mesmo estudo, os portugueses gastam um mínimo de 30 euros por mês nestas deslocações, ou seja, o valor do passe municipal, sendo que este valor aumenta muito com a utilização de carro próprio. Já no teletrabalho, estima-se, por alto, um custo mínimo equivalente, se considerarmos apenas os custos relacionados com as despesas acrescidas de água e eletricidade.
Tanto o teletrabalho como o trabalho presencial no escritório apresentam vantagens e desvantagens: enquanto o teletrabalho elimina os custos, o tempo e a experiência da deslocação, o trabalho na empresa traz vários benefícios a nível social e emocional.
Uma alternativa para a deslocação para o local de trabalho que pode eliminar algumas das desvantagens supracitadas é a utilização de um programa de transporte coletivo, enquanto os subsídios de transporte também podem funcionar como encorajamento.
Apesar de parecer uma boa opção ter funcionários em teletrabalho, tornou-se evidente que não é a opção mais beneficiadora para os funcionários e para as empresas, tanto a nível de custos como da produtividade e bem-estar. A solução passa pela criação de modelos híbridos, mas acima de tudo pela disponibilização de serviços de transporte coletivo ou subsídios e transporte que possam tornar esta viagem numa opção mais atrativa.
Além de retirarem o fardo da deslocação por conta própria, a opção do transporte coletivo também prima pela sustentabilidade, um tema na ordem do dia, que leva à urgência de uma mudança radical na forma como o percurso para o trabalho tem vindo a ser feito. Os programas de transporte coletivo permitem o estabelecimento de uma rotina, o incremento da socialização entre colegas de trabalho e uma viagem para o local de trabalho mais saudável, menos dispendiosa e mais amiga do ambiente.